A solidão e o medo das alturas


"‘Dos filmes do Mathias, qual é o que gostas mais?’
Caixa em forma de coração.’
‘Gostei muito desse, embora, da sua filmografia, seja o menos volkeriano…’
‘E tu?’
O anjo exterminador, com a Sky Montenegro.’
‘Deu ontem na televisão.’
‘Eu sei. Não vi. Não quis ver. Não consigo ver os filmes dele sem me lembrar daquele dia… ‘
‘Qual é a tua cena favorita?’
‘Aquela em que ela corta o cabelo diante do espelho. É o momento em que se dá a fragmentação da sua personalidade e ela se transforma no anjo exterminador. É uma imagem lindíssima e ao mesmo tempo terrível, o cabelo comprido de um lado, mais curto do outro, um olho de cor…’
‘Talvez um dia consigamos esquecer… Esquecer não, ultrapassar.’
‘Talvez…’
‘Às vezes imagino-te a entrar no elevador e a vires ter comigo, a bateres-me à porta. Eu saio de casa, entro contigo no elevador, beijamo-nos, rimo-nos, e saímos do prédio de mãos dadas.’
‘Primeiro vamos ao cinema, depois jantamos, e antes de virmos para casa damos um passeio à beira-rio.’
‘Subimos ao meu apartamento e fazemos amor.’
‘Ou ficamos logo pelo rés-do-chão, no meu covil de solteirão…’
‘Meu amor…’
‘Vamos dormir, Rapunzel, já é tarde.’
‘Amanhã tens consulta?’
‘Sim. O Benjamin fica a substituir-me.’
‘Assim que voltares, telefona-me.’"

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